quinta-feira, 23 de junho de 2011

em Simplismente Monólogos



Há poucos meses conheci, em Recife, o Espaço Muda. Apaixonei-me pelo lugar. Aquele ambiente pequeno mas aconchegante, com um bistrô servindo pratos deliciosos, o pessoal estiloso da cena alternativa circulando por ali, um espaço com exposições de artistas plásticos já conceituados ou emergentes na área. Ah! O brechó pra incrementarmos o guarda-roupa super-style. E claro, o chamariz pricipal: o galpão onde aconteciam os espetáculos. Teatros, bandas, leituras dramatizadas. Muita coisa interessante podia-se assistir ali, sentado em deliciosas poltronas, sofás, sobre almofadas ou pufes, ou no chão. O ambiente era aconchegante, apaixonante. Mal sabia eu que ali faria boas amizades no meio cultural da cidade. Conheci Jorge Féo. Em seguida lá já estava eu toda semana, em um curso com o jovem mestre, incrementando meu repertório de ator e aprendendo com sua arte de atuar na simplicidade.


Lá tinham pessoas que se interessavam profissionalmente pelo teatro, e também iniciantes nessa arte mágica. Ficamos todos amigos e o resultado de nosso primeiro trabalho juntos, bem delineado e afinado pelo diretor Jorge Féo, foi apresentado na última quinta-feira, 16. O exercício chamou-se "Simplismente Monólogos" e trouxe textos do escritor mineiro Anderson Aníbal, em seu livro "Alguns Leões Falam".




















Aqui deixo minhas doces lembranças desse dia em que celebramos mais que um exercício de palco, mas um brinde ás grandes amizades que fazemos no caminho da vida. Obrigado Milena, Maiana, Gian, Dani, Brenda, Jay e Jorge pela parceria e carinho no trabalho. E claro, obrigado Aníbal pelos belos textos que escrevestes e que nos servira de mote para essa reunião tão gratificante.




Com o texto "O Sonho de André", pude conhecer e emprestar-me para esse personagem tão carinhoso que é o sonhador André. Ele tem um cachorro chamado Marcelo, que sempre quis ser um leão. Um dia André sonha que Marcelo era, de verdade, um leão.



André tem outros dois grandes amigos: Clara e Rocha. Eles cresceram juntos e desde crianças brincavam muito, na praia. Um dia inventaram até uma máquina que fazia as pessoas pararem de sentir dor. Hoje André vive longe dos amigos, mas faz uma viagem para ir reencontrá-los. Clara e Rocha vão se casar. E André, sempre sonhador, preocupa-se com o futuro... o que será do amanhã?...


Pareço um bocado com André... Também sinto enorme saudade de um casal de amigos. E do cachorro do meus amigos, Cipó...


Abaixo, um pouco mais do André.




* Agradecimento especial a Brenda Lígia e Marcelo Pinheiro pelas fotos.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Sobre Párias – somos vários dessa espécie



Na antiga sociedade indiana os indivíduos considerados de castas inferiores eram chamados párias, ou dalits. Eram seres desmerecidos do crédito social, desafortunados da mínima dignidade e reconhecimento. Poderíamos fazer diversos contrapontos com nossa sociedade atual e reconhecer muitos párias que convivem em nosso cotidiano. Ou pior - e por que não melhor – reconhecermos nós mesmos como um, talvez...


Na nova peça da Cia Anjos de Teatro o ator Arion Medeiros nos traz o personagem Nioukhine, de “Sobre os Males do Fumo” de Tchecov e Jorge Féo e Thiago França trazem à cena os enigmáticos personagens de Strindberg em “O Pária”.


A montagem dos três atores e dois autores traz unidade no contexto. O desdobramento dos artistas em atuar e dirigir uns aos outros deve ter seus esforços reconhecidos: concluíram um trabalho uniforme. Foi coerente a proposta de unir dois grandes textos e autores num espetáculo de nome Párias, denunciando ou relembrando a nós, espectadores, que sim, somos vários dessa espécie.

Sobre o trabalho dos atores


Conhecer um ator antes de vê-lo atuar faz-nos criar expectativas com relação a seu trabalho. Conheci Arion Medeiros em minhas andanças pelo Espaço Muda; cruzava com ele ora saindo das aulas do Féo, ora pelo bistrô ou hall de entrada e se trocamos meia dúzia de palavras foram muitas, quase sempre oi`s e tchau`s quase mudos, ou só ditos por gestos. E vendo ele um homem calado, semblante austero, talvez eu esperasse daquele corpo, embora franzino, uma voz grave, forte. Quando o vi entrando em cena no monólogo de Tchecov, confesso que fiquei surpreso ao ouvir sua voz, no palco, pela primeira vez. Era um timbre fino, agudo. Então pensei que ele falava em falsete ou criara aquela voz e, por um breve momento, julguei mal tal escolha de voz para o personagem, mas deixei-me levar pela magia que Arion conquistava em cena e logo reconheci: como aquela fragilidade sonora compunha perfeitamente o homem inseguro ali tão bem representado! Minhas suposições sobre o trabalho de ator de Arion Medeiros foram confirmadas: em grande ator em cena.


No segundo quadro do espetáculo Jorge Féo e Thiago França encantam pela perfeita sintonia no palco. Jorge traz um personagem tímido no início da cena, como pede o proposto. Á medida que vai crescendo o diálogo de seu papel, é sutil e preciso ao delatar, com o tempo, que aquele homem tem um vulcão dentro de si que a qualquer momento pode entrar em erupção. Thiago França entra em cena marcando forte presença, ciente das atitudes e convicto de suas palavras – seu personagem necessita desse vigor e um ator inseguro não o faria tão bem. Thiago exibe boa técnica de memorização, mas embora o texto componha um personagem que tenha inteligência hábil e diálogo vivo, a cadência de tempo que o ator usa para jogar o texto em certos momentos antecipa o tempo real da personagem, comprometendo a verdade cênica desses breves momentos.

Sobre cenário e figurino e trilha sonora


O cenário foi composto com esmero: tinha os objetos cênicos corretos sem cair em ambientações demasiadamente carregadas. A busca pelo simples porém eficiente - que permeia o teatro de Jorge Féo – estava presente ali. O cenário denunciava seriedade com uma grande mesa à espera do gabaritado palestrante (Arion na primeira cena) e forte o bastante para suportar o inflado ego do jovem pesquisador de inteligência hábil representado por Thiago França na segunda cena. Na estante, os livros de capa dura vermelha, levemente empoeirados, ajudavam a denunciar um clima que quase nos levava ao passado. E embora os textos ainda revelassem um linguajar longe dos nossos diálogos contemporâneos, havia no figurino o toque de mágica que nos lembrava a validade atual dos discursos representados: todos atores usavam tênis all-star branco. Brilhante sacada de Féo!


A trilha sonora preparada especificamente para a peça tem seu mérito no trabalho. Desde o som ambiente na entrada do público até as interferências sonoras durante o espetáculos, todas as músicas foram bem escolhidas e o tango de Piazolla caiu muitíssimo bem. Congratulações a Zé Manoel.


O espetáculo fica em cartaz todas as sextas, ás 20h, no Espaço Muda, até final de Julho. Vale a pena conferir!